quinta-feira, 13 de maio de 2010




‘Inducação’ escreve é com três ‘ésse’ ou com dois?

* Por Fernando Yanmar Narciso

Antigamente, haviam apelidado aquele caixote preto – ou moldura preta, dependendo da idade – que todos temos na sala de “máquina de fazer doido”. Em nossa atual situação, eu diria que a demência que ela cria é outra. Sem a televisão e o computador, nossas vidas ficam muito vazias. O problema é que, tendo ambos, também. Quando não existiam derivados do mesmo conceito, como celulares e computadores, todo mundo fritava os olhos na frente da TV.

Recentemente, eu recebi uma mensagem em PowerPoint bem perturbadora.

Sabiam que, em São Paulo, apenas 5% dos alunos que concluem o Ensino Médio conseguem ler e escrever bem? É um assombro, levando-se em consideração que estamos falando da cidade mais desenvolvida do país. Nesse ritmo, nos cafundós do Brasil, os “alunos” estariam dependurados no ventilador de teto da sala de aula e quem sabe até comendo fezes uns dos outros.

Uma coisa é certa: todos esses “alunos” assistem TV. E muita. O Brasil é o país onde as crianças perdem mais tempo na frente da tela. OK, eu sei que vivo falando sobre os mesmos assuntos sempre, mas não é de hoje que a programação da TV aberta, e até da TV por assinatura, vive de estuprar as nossas mentes. Quase toda a programação de qualquer canal dos mais assistidos vale-se de exercícios de futilidade, vulgaridade, egolatria e, acima de tudo, consumismo imoral e hegemônico. De cada 10 minutos de programação, nove são propagandas do novo xampu, do novo refrigerante, do brinquedo da moda, do carro do ano, das novas estripulias do Rei de todos nós, Steve Jobs... Parece que Descartes estava errado, afinal. A frase correta seria “Possuo, logo existo”?

As palavras do Boni, o todo poderoso ex-diretor da Globo, definem a nós, sua audiência, como “massa desinformada, portanto, fácil de iludir”, “perfil triste de telespectadores”, que “não têm a menor idéia do que estão fazendo diante da TV”. Palmas pro Painho Boni, pessoal! Não podia ter nos descrito de forma melhor! Mas não nos deixemos enganar. Ele não está nem um pouco preocupado com a gente. Afinal, se estivesse, comandaria uma gráfica de livros didáticos, não uma emissora. Para ele, quanto mais “danças do créu” e “rebolations” surgirem, melhor pros negócios. Tudo o que ele precisa são de mais compradores e mais vendedores, não de mais intelectuais e gente solidária.

Também, sejamos realistas, né, gente? Ler é uma coisa muito chata! Livros são a forma mais arcaica de aprendizado que existem, do tempo em que as coisas “não se moviam”. Vivemos na era da velocidade supersônica. Ninguém quer saber dos meios hoje em dia, apenas dos resultados. Criança alguma gosta de livros, a menos que sejam os livros-modinha, como Harry Potter ou “Prepúciolo”, ou uma coletânea da revista Capricho. A única preocupação básica de qualquer brasileiro é com “o de comer”. Assim que toda a população estiver de bucho forrado, teremos tempo de pensar nas outras “trivialidades”, como o sistema de ensino.

Por lei, todas as emissoras abertas têm a obrigação de passar programas didáticos ou que ensinam a preservar o meio-ambiente. A intenção é louvável, mas acontece que eles só os exibem lá pelas cinco da matina, depois dos programas religiosos, hora em que nem o programador da emissora tá acordado. Mas pensando bem, adiantaria alguma coisa se tais programas fossem exibidos às 7, 8 horas? Acho que não, pois ninguém em sã consciência liga a TV com a intenção de aprender alguma coisa.

Não desaprovo a intenção do autor da mensagem PowerPoint, mas acho irônico o meio que usou para propagar seus ideais: Uma tela, aparentemente a sua maior inimiga. No lugar dele, eu usaria todos os outros métodos disponíveis para dar o recado, como mensagens no rádio, páginas no jornal, aviões carregando faixas. A lista de mídias alternativas é extensa, e corre o risco de acabar desaparecendo, devido à facilidade de se ler uma notícia na internet.

Para melhorar a situação deplorável dos nossos alunos, seria necessário antes fazer uma verdadeira revolução na forma de se ensinar, algo que prendesse a atenção dessa galerinha “sorvete-na-testa” e os inspirasse. Contar apenas com livros, professores e a psicologia não basta. Afinal, álgebra e estudos sociais nunca foram e nem serão os interesses primordiais de um aborrecente. O autor do PPS nos mandou – ou sugeriu, sei lá... – desligarmos a TV e recordar que há toda uma vida nos esperando lá fora. Ah, que maravilha de mundo, cheio de violência, prostituição infantil, drogas, poluição, crimes, corrupção, engarrafamentos, desastres naturais... Mal posso esperar. Oh, olha! BBB!

* Fernando Yanmar Narciso, 26 anos, formado em Design, filho de Mara Narciso, escritor do blog “O Blog do Yanmar”, http://fernandoyanmar.wordpress.com

Um comentário:

  1. Concordo com você em quase tudo, mas quando diz que "ler é uma coisa muito chata" discordo. Depende do livro,Fernando. Só um exemplo: li em 4 dias mais de 400 páginas do livro "Clarice", a biografia da Clarice Lispector. Mas estou há um mês lendo "Crime e Castigo".
    Este último livro é chato? De jeito nenhum. É que o clima é pesado, sofrido, mexe demais comigo, me dá tristeza, angústia, mas é muitíssimo bem escrito. Uma aula para quem quer ser escritor.
    Acho que quando a gente começa a ler livros interessantes, sente tanto prazer, quanto o que proporciona um belo filme.
    Mas gostei muito do seu texto, nos faz pensar, e esta é uma das funções do escritor. Parabéns!

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