

Medo do futuro
* Por Pedro J. Bondaczuk
A falta de um objetivo definido para a vida, que não seja a mera satisfação dos desejos físicos ou a corrida (sem sentido) em busca da fortuna e do poder, têm conduzido muitas pessoas a um angustiante beco sem saída. Impedem que elas gozem plenamente desta aventura – às vezes perigosa, em alguns casos decepcionante, mas provavelmente única (quem sabe?) – que é simplesmente viver.
Tais considerações vêm a propósito da primeira pesquisa nacional realizada nos Estados Unidos pelo Instituto Gallup em 1991, acerca de suicídio na adolescência. O estudo revelou que 6% dos jovens norte-americanos já haviam tentado na ocasião dar cabo da própria vida e 34% confessaram que chegaram a pensar nessa possibilidade.
Ressalte-se que estas pessoas, ao menos em teoria, estão muito longe de serem consideradas pobres ou infelizes, pelos padrões usualmente adotados sobre riqueza e felicidade. Não têm, portanto, pelo menos aparentemente, razões para um gesto tão tresloucado. São, em geral, provenientes das classes média e alta. Portanto, teoricamente, têm (ou já tiveram) acesso a tudo o que a vida pode proporcionar de melhor.
Quais são, então, as causas desse desencanto tão profundo, ao ponto desses rapazes e moças, que mal completaram a sua formação física e psicológica, optarem por um expediente tão extremo, radical e dramático, como a busca da morte pelas próprias mãos? As razões mais vezes apontadas pelos adolescentes que participaram da pesquisa foram três, na seguinte ordem: 22% temiam converter-se em adultos; 20%, por excesso de consumo de drogas e 16% por pressões sociais.
O conflito entre gerações, tão comum nas décadas de 50 e 60, e que ocupava o topo da relação das causas que mais revoltavam os jovens naquele tempo, atualmente não parece ser tão relevante. Somente 14% dos adolescentes entrevistados apontaram, como razão para a tentativa de suicídio, problemas com seus pais.
Mas seria tão ruim se tornar adulto? Haveria algo de errado em assumir responsabilidades, em dizer ao mundo para o que se veio, com que finalidade estamos neste Planeta, às vezes maravilhoso e às vezes hostil e assustador? Há algo de tão negativo no fato de exibirmos diante dos semelhantes nosso "cacife", os talentos e virtudes com que fomos dotados e que nos credenciam, ao menos em teoria, para sermos "vencedores" nesta corrida de obstáculos, sem regras fixas, ou que são a todo o instante violadas? Antes, se faz necessária a definição do que significa "vitória". E esta é uma tarefa extremamente subjetiva, com "n" alternativas. Cada um tem sua "fórmula" de sucesso, embora sem nenhuma convicção acerca da sua infalibilidade.
Para uns, vencer significa ser "feliz", outro termo ambíguo e genérico, que tem significados muito diversos de uma pessoa para outra. Outros, entendem que sair vitorioso na "batalha" da vida é deixar um nome, uma obra, uma marca da sua passagem por este mundo. E as alternativas se sucedem, de acordo com as crenças e as fantasias de cada um. Todos podem estar certos. Mas todos podem também estar errados.
O que sabemos? Não há quem possa servir de árbitro na questão. A incerteza é idêntica para todo o mundo, assim como a insegurança, embora haja quem queira aparentar uma auto-suficiência, que na verdade não possui, e sabe disso. Cada qual terá de escolher, sozinho, seu próprio caminho. É uma estressante roleta-russa. Ninguém, seja qual for seu grau de conhecimento, ou sua fortuna, está absolutamente a salvo de temores de fazer uma escolha equivocada e fracassar.
Todavia, desde que não seja exacerbado, este e qualquer outro medo são, não somente naturais, como indispensáveis. Trata-se de um saudável e bem-vindo mecanismo de auto-proteção. Ajuda o indivíduo a se preservar. A não botar, por exemplo, a mão no fogo, a não ficar na frente de um automóvel em alta velocidade e a não saltar do décimo andar de um edifício, entre outras tantas cautelas. O escritor norte-americano Samuel Clemens, mais conhecido pelo pseudônimo literário que adotou, de Mark Twain, constatou: "A coragem é a resistência ao medo, o domínio do medo e não a ausência do medo".
O absoluto destemor não significa, como se pensa, coragem. É, isto sim, o sintoma mais característico da loucura. É irmão gêmeo da temeridade e da irresponsabilidade. Não devemos procurar "do outro lado" da vida (se é que ele existe) as explicações que não encontramos neste. O poeta Ledo Ivo expressou, nestes sábios e judiciosos versos: "O outro lado da vida é aqui mesmo./O outro lado da vida é onde estamos". Talvez seja. Talvez não. Quem pode afirmar com certeza?!
E a escritora inglesa Virgínia Wolf, cujo cinqüentenário de morte transcorreu em 1991, observou: "A vida não é uma série de lanternas de carruagens arrumada simetricamente; a vida é um halo luminoso, um invólucro semitransparente que nos envolve do começo ao fim da consciência". A propósito, ela deu cabo da sua, cometendo suicídio... Ao fim e ao cabo, portanto, trata-se de um grande mistério. E tudo o que se possa dizer a respeito não passa de vã especulação e nada mais. Afinal, o que sabemos nós, pobres mortais?!
*Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas), com lançamentos previstos para os próximos dois meses. Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com
* Por Pedro J. Bondaczuk
A falta de um objetivo definido para a vida, que não seja a mera satisfação dos desejos físicos ou a corrida (sem sentido) em busca da fortuna e do poder, têm conduzido muitas pessoas a um angustiante beco sem saída. Impedem que elas gozem plenamente desta aventura – às vezes perigosa, em alguns casos decepcionante, mas provavelmente única (quem sabe?) – que é simplesmente viver.
Tais considerações vêm a propósito da primeira pesquisa nacional realizada nos Estados Unidos pelo Instituto Gallup em 1991, acerca de suicídio na adolescência. O estudo revelou que 6% dos jovens norte-americanos já haviam tentado na ocasião dar cabo da própria vida e 34% confessaram que chegaram a pensar nessa possibilidade.
Ressalte-se que estas pessoas, ao menos em teoria, estão muito longe de serem consideradas pobres ou infelizes, pelos padrões usualmente adotados sobre riqueza e felicidade. Não têm, portanto, pelo menos aparentemente, razões para um gesto tão tresloucado. São, em geral, provenientes das classes média e alta. Portanto, teoricamente, têm (ou já tiveram) acesso a tudo o que a vida pode proporcionar de melhor.
Quais são, então, as causas desse desencanto tão profundo, ao ponto desses rapazes e moças, que mal completaram a sua formação física e psicológica, optarem por um expediente tão extremo, radical e dramático, como a busca da morte pelas próprias mãos? As razões mais vezes apontadas pelos adolescentes que participaram da pesquisa foram três, na seguinte ordem: 22% temiam converter-se em adultos; 20%, por excesso de consumo de drogas e 16% por pressões sociais.
O conflito entre gerações, tão comum nas décadas de 50 e 60, e que ocupava o topo da relação das causas que mais revoltavam os jovens naquele tempo, atualmente não parece ser tão relevante. Somente 14% dos adolescentes entrevistados apontaram, como razão para a tentativa de suicídio, problemas com seus pais.
Mas seria tão ruim se tornar adulto? Haveria algo de errado em assumir responsabilidades, em dizer ao mundo para o que se veio, com que finalidade estamos neste Planeta, às vezes maravilhoso e às vezes hostil e assustador? Há algo de tão negativo no fato de exibirmos diante dos semelhantes nosso "cacife", os talentos e virtudes com que fomos dotados e que nos credenciam, ao menos em teoria, para sermos "vencedores" nesta corrida de obstáculos, sem regras fixas, ou que são a todo o instante violadas? Antes, se faz necessária a definição do que significa "vitória". E esta é uma tarefa extremamente subjetiva, com "n" alternativas. Cada um tem sua "fórmula" de sucesso, embora sem nenhuma convicção acerca da sua infalibilidade.
Para uns, vencer significa ser "feliz", outro termo ambíguo e genérico, que tem significados muito diversos de uma pessoa para outra. Outros, entendem que sair vitorioso na "batalha" da vida é deixar um nome, uma obra, uma marca da sua passagem por este mundo. E as alternativas se sucedem, de acordo com as crenças e as fantasias de cada um. Todos podem estar certos. Mas todos podem também estar errados.
O que sabemos? Não há quem possa servir de árbitro na questão. A incerteza é idêntica para todo o mundo, assim como a insegurança, embora haja quem queira aparentar uma auto-suficiência, que na verdade não possui, e sabe disso. Cada qual terá de escolher, sozinho, seu próprio caminho. É uma estressante roleta-russa. Ninguém, seja qual for seu grau de conhecimento, ou sua fortuna, está absolutamente a salvo de temores de fazer uma escolha equivocada e fracassar.
Todavia, desde que não seja exacerbado, este e qualquer outro medo são, não somente naturais, como indispensáveis. Trata-se de um saudável e bem-vindo mecanismo de auto-proteção. Ajuda o indivíduo a se preservar. A não botar, por exemplo, a mão no fogo, a não ficar na frente de um automóvel em alta velocidade e a não saltar do décimo andar de um edifício, entre outras tantas cautelas. O escritor norte-americano Samuel Clemens, mais conhecido pelo pseudônimo literário que adotou, de Mark Twain, constatou: "A coragem é a resistência ao medo, o domínio do medo e não a ausência do medo".
O absoluto destemor não significa, como se pensa, coragem. É, isto sim, o sintoma mais característico da loucura. É irmão gêmeo da temeridade e da irresponsabilidade. Não devemos procurar "do outro lado" da vida (se é que ele existe) as explicações que não encontramos neste. O poeta Ledo Ivo expressou, nestes sábios e judiciosos versos: "O outro lado da vida é aqui mesmo./O outro lado da vida é onde estamos". Talvez seja. Talvez não. Quem pode afirmar com certeza?!
E a escritora inglesa Virgínia Wolf, cujo cinqüentenário de morte transcorreu em 1991, observou: "A vida não é uma série de lanternas de carruagens arrumada simetricamente; a vida é um halo luminoso, um invólucro semitransparente que nos envolve do começo ao fim da consciência". A propósito, ela deu cabo da sua, cometendo suicídio... Ao fim e ao cabo, portanto, trata-se de um grande mistério. E tudo o que se possa dizer a respeito não passa de vã especulação e nada mais. Afinal, o que sabemos nós, pobres mortais?!
*Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas), com lançamentos previstos para os próximos dois meses. Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com
Nunca pensei nisso, mas hoje me dou
ResponderExcluirconta do quanto estive perto de assistir.
A adolescência é uma fase "mega" difícil onde tudo se agiganta...achamos que a vidinha deles
é light, fácil. A sensibilidade tem que estar
on line...senão os perdemos.
Parabéns Pedro.
beijos
Preciso perder meu último medo: voar. Os demais estão sob controle seguro. Muitos buscam a liberdade e a independência, mas quando elas chegam assustam-se. Não sabem o que fazer com, elas. Isso faz muitos seguirem pelo suicídio, num ímpeto, sem muito pensar. Quando o sofrimento é maior que o instinto de sobrevivência, para o suicida, a morte liberta.
ResponderExcluirO que muito me preocupa, Pedro, além dos suicídios dos jovens em geral é o grande número de suicídios dos indígenas brasileiros. De vez em quando a imprensa noticia, e fico pensando: o que os leva ao suicídio? A não-integração à sociedade branca, a falta de perspectivas, a discriminação? Não sei.
ResponderExcluirTema muito pertinente. Gostei.
sempre digo pra minha mãe que n passa um só dia sem que eu pense em suicídio
ResponderExcluirsentir o fogo da adolescência escapar por nossos poros a cada dia é um sentimento horrível, assim como aos poucos ir se dando conta que a juventude não pode mais mudar esse mundo cruel- pelo menos, não pra melhor. por outro lado, suicídio soa a mim como uma fuga. a admissão da minha covardia, então adio o copo de soda cáustica por mais alguns dias. Afinal, não posso deixar esse mundo sem que ele tenha tido conhecimento da minha existência.
adorei seu texto, pedro. queria colocar ele no meu blog também.
um grande abraço.