terça-feira, 14 de julho de 2009


O pai do Ronaldo

* Por Rodrigo Viana

Sábado, manhã gelada em São Paulo e a preguiça ali, me pedindo pra ficar com ela. Fiquei um pouco, confesso. Pouco depois da 1 da tarde saí pra almoçar... Andei um pouco pela Avenida Paulista observando os arranhásseis de cimento. Engraçado, como aos sábados, São Paulo lembra-me o interior e os prédios perdem sua força. Olhando pro alto, até o céu fica de interior... mas, ao menos por agora, deixemos essas bobas nostalgias de início de inverno.
Resolvi parar no Prainha, um restaurante/choperia simpático, numa das travessas da Paulista. Sentei-me ao lado de outro solitário. O senhor, de pele escura de sol, ar acolhedor e sorriso no canto dos olhos, cumprimentou-me. Pareceu-me familiar. Aquele óculos suspenso na testa ... parecia...seu Nélio, o pai de Ronaldo. Sim, ele mesmo, o fenômeno.
- O senhor é o pai do Ronaldo? – atrevi
- Sou, sou – monassilabou com o canto da boca.
Numa das mãos um cigarro – Hollywood – é bom registrar. E na outra um copo de whisky. No início – e somente no início – fiquei em dúvida se deveria me aproximar mais, falar do Ronaldo, Corinthians....ou qualquer outra petulância descabida naquele momento. Fiquei quieto. Passou um rapaz na calçada e disse: “Sr. Nélio, sou fã do filho do senhor, hein...” Nada que esse homem, de jeitão comum, não deva ter ouvido 1 zilhão de vezes.
Depois veio o garçom-chefe e estacionou ali.
- O Ronaldo vai pra Copa, o senhor vai ver. Queria o Ronaldo no Guarani, sou de Campinas. O Ronaldo jogou muito contra o Inter, fez um golaço.

Enfim, bajulou toda a série de ronaldices que você, leitor, pode imaginar. Pra minha surpresa, o seu Nélio entrou na conversa. Respondia ao garçom com tranqüilidade. Monossilabava, é verdade. Mas o olhar era de quem estava na conversa. E convidava-me à tertúlia.

Mais um copo de whisky.
- O Dunga vivia grudado no Ricardo Teixeira, na Copa da França, em 2006. Ninguém me falou. Eu vi,.eu estava lá.... O Mano é gente boa, parece bravo só na televisão. Onde já se viu o São Paulo mandar o Muricy embora...

Era seu Nélio – torcedor comum – opinando...
- Você é jornalista, deve saber melhor que eu.

Tudo o que sei é que nada sei. Sócrates, o filósofo acertara em cheio na Antiga Grécia. A essa altura, eu via choppe e ele, com o inseparável whisky e cigarro Hollywood, já conversávamos na mesma freqüência.

Comecei a entender a simplicidade do Ronaldo. Não havia, nas palavras dele, nenhum tom de “pai do Ronaldo”. Perguntei a ele se estava no restaurante pelo nome: “Prainha”, pelo visual parecido com o do Rio de Janeiro. Ele falou que gostava sim do visual, mas havia parado ali por acaso, o mesmo acaso que me fez encontrá-lo.
- Caminhei duas horas...do hotel até aqui, caminho todos os dias, faz bem, né?

Faz sim, seu Nélio, faz bem ver como a vida é simples. Não, não tirei nenhuma fotografia. Achei que seria gratuito. A imagética do texto é mais nítida, nesse caso. Teve uma frase que eu disse no meio da conversa, seu Nélio riu, levou na boa, mas foi inevitável. Acho que dá pra fechar a crônica com ela:
- Se não fosse a porra do senhor, hein seu Nélio!

* Boleiro, jornalista, professor universitário e cronista de Araraquara/SP, www.blogdorodrigoviana.blogspot.com

2 comentários:

  1. A contribuição foi exatamente essa: um espermatozóide. Mas o ambiente, os exemplos e a criação conduz ou desconduz, desenvolve ou atrofia. É, vai um pouco além do esperma sim.

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  2. claro...vai além do esperma Mara
    obrigado pela leitura

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