sábado, 8 de setembro de 2018

Não é só por uma árvore, é pela cidade - Sally Satler


Não é só por uma árvore, é pela cidade


* Por Sally Satler

Nesses tempos em que devemos defender o óbvio, relutei muito em escrever sobre a figueira que luta, com a ajuda de muitas pessoas, para manter-se viva na Rua Heinrich Hosang, em Blumenau. Mas é necessário. É urgente. 


O Ministério Público firmou termo de ajustamento de conduta (TAC) com a construtora Torresani, com o Condomínio Porto Real e o Município de Blumenau, a fim de garantir a metragem mínima de passeio público para os pedestres passarem na frente do Condomínio. 

E a solução para a regularização, pasmem, foi determinar a morte da árvore que está ali há mais de 40 anos. Não foi cogitada a adequação da construção, possivelmente porque a construtora não quer arcar com os custos disso. E pouco importou aos envolvidos que a Construtora tivesse ignorado completamente em seus projetos a figueira ali existente.

Mas o que a Promotoria, a Construtora, o Síndico do prédio e a Prefeitura não contavam era com as pessoas, os coletivos e as entidades que estão resistindo a essa solução vexatória. Um grupo foi ao Ministério Público e à Prefeitura para tentar reverter a ordem de corte, que restou, com o perdão do trocadilho, infrutífera. 

Sabemos que a ABC Pró Ciclovias fez pedido por escrito de reconsideração ao Ministério Público, nos autos do Inquérito Civil. Mas já sabemos também que não podemos contar apenas com a ‘sensibilidade’ da Promotora Monika Pabst.

Por isso, entendo importante e urgente que as entidades de Blumenau que lutam por causas ambientais e urbanísticas, busquem anular esse TAC judicialmente. É possível sim, ajuizar ação de anulação do termo de ajustamento de conduta contra todos os que firmaram o TAC, inclusive o Ministério Público e o Estado de SC – como pessoa jurídica atrelada ao MP – pedindo também uma tutela de urgência (medida liminar), a fim de impedir o corte da árvore até a decisão final da ação anulatória.

Um TAC não pode servir de alvará para agredir outros interesses coletivos/difusos. As árvores não podem mais ficar marcadas para morrer em tempos de escassez de área verde, como é o caso da região central de Blumenau, que sofre com temperaturas de mais de 40 graus no verão e com o excesso de gás carbônico. 

Existem alternativas de regularização, como ampliação do passeio, deslocamento de equipamentos do prédio, etc. E quem construiu e lucrou, que arque com isso. Precisamos romper paradigmas, caso contrário, não sobrará uma única árvore de grande porte na região central da cidade.

Não é só pela árvore da rua Heinrich Hosang que escrevo. É pelo que esta árvore simboliza. Por essas pessoas que estiveram e ainda estão alertas ao seu lado, lutando para que a cidade não se defina somente por concreto e ferro, calor e gás carbônico. É por uma Blumenau mais humana, mais agradável, com mais árvores, parques, passeios regulares, com transporte público de qualidade e ciclovias interligadas.


* Escritora, historiadora e advogada.

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